Sou admiradora da professora e escritora Lu de Oliveira, peço licença a ela pra publicar em meu blog, seu texto “Órfãos de pais vivos”. Eu, como professora, também convivo diuturnamente com "órfãos de pais vivos" no meio escolar. Faço minhas as palavras da Lu. Eis o texto:
"Òrfãos de pais vivos" Por Lu Oliveira
Tenho compaixão de crianças e adolescentes que já não têm o pai
ou a mãe, ou os dois, o que é mais triste. Mesmo que fiquem sob os
cuidados de familiares, viver sem o colo materno para um aconchego ou
sem o ombro paterno na hora de uma dificuldade é muito difícil para os
pequenos. E se tenho compaixão desses meninos e meninas, também nutro o
mesmo sentimento pelos órfãos de pais vivos.
Sei que a expressão é forte e usá-la é correr o risco de ser mal
interpretada. Primeiramente, é preciso deixar claro que, caso eu tivesse
a fórmula para educar, já a teria embalado em frascos e a estaria
vendendo a preço de ouro. Como mãe, sinto-me desafiada todos os dias a
cumprir meu papel mantendo o equilíbrio entre afeto e autoridade.
Confesso que nem sempre consigo e a sensação de ter falhado é bastante
incômoda. E preciso mesmo me incomodar. Quem não se incomoda se acomoda.
Em Maringá, nas últimas semanas, casos de festas embaladas a
álcool envolvendo adolescentes ocuparam espaço nos noticiários. Faz
poucas semanas, a revista “Veja” trouxe como reportagem de capa o triste
quadro do consumo de bebidas alcoólicas entre menores de 18 anos. A
lei proíbe, mas, como em outras tantas situações neste País, há um
abismo entre a vida como ela deveria ser e como ela realmente é.
Imaginar adolescentes de 13 e 14 anos, por exemplo, intercalando
doses de vodka e copos de cerveja é assustador por vários motivos, mas o
que mais me inquieta é entender como eles foram parar nessas festas,
afinal, seria o caos imaginar que, além de beber feito adultos, também
dirigem seus próprios carros. Alguém precisou levá-los até lá, seja o
pai, a mãe, o tio, o irmão. Um adulto deixou esses adolescentes em um
lugar sem ao menos se informar se o programa era adequado para aquela
faixa etária. Discutindo isso com uma colega, ela argumentou que muitos
mentem para poder sair, às vezes até argumentando que o colégio que
frequentam está organizando a tal festa. E muitos pais, ingênuos, não se
dão ao trabalho de averiguar a informação.
Há quem defenda veementemente o diálogo como a base para um
relacionamento harmonioso. Faz sentido. Entretanto, dialogar com o filho
não quer dizer ouvi-lo e lhe conceder tudo que ele pedir. O
medo de que o não cause algum trauma ou faça a meninada perder o amor
pela família está criando uma geração que tem extrema dificuldade em
perceber que a vida impõe limites.
Lembro-me de um caso emblemático para esta discussão: um pai,
cujo filho havia sido pego com uísque em uma viagem da escola, foi
chamado pela direção para conversar. Depois de admitir que ele mesmo é
que havia comprado a bebida para o menino, suplicou para que o colégio
não relatasse o episódio para a esposa. Se houvesse um concurso de órfão
de pai vivo, certamente esse aluno ganharia o primeiro lugar com
louvor.
Educar exige um esforço quase sobre-humano, ainda mais quando
temos que preparar nossos filhos para dizer não aos convites que o mundo
faz. Crianças e adolescentes vão tentar burlar as regras, vão tentar
transgredir os combinados, vão tentar infringir as normas estabelecidas
durante o jantar em família. Todos nós, um dia, de um jeito ou de outro,
tentamos fazer isso quando tínhamos 15 anos. O problema não é só a
tentativa do jovem, mas a negligência do adulto.
Muitas crianças e adolescentes perderão os pais, afinal, se há
algo que faz parte da vida é a morte. Mas é cruel demais que fiquem
órfãos mesmo quando exista alguém ao lado deles.
Lu Oliveira – Coluna Francamente – Jornal O Diário – 1o. 08.2012. |
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